segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

A poetisa da Alma

Margarida era uma poetisa. Não porque escrevesse e fosse famosa, mas porque era uma poetisa da Alma...

Como habitualmente, Margarida saiu de casa logo pela manhã cedo. Ia trabalhar.
Fechou a porta de casa à chave e montou-se na bicicleta. Olhou para o céu e pôs-se a caminho. 
Não tinha andado ainda uns cem metros, quando reparou que tinha um pneu furado. Saiu da bicicleta e encolheu os ombros, parecendo resignar-se, mas o sorriso não lhe saiu do rosto.
Mal acabara de sair da bicicleta, quando começou a chover torrencialmente. Margarida recolheu-se ainda mais para debaixo da varanda do prédio ao pé do qual tinha parado e aguardou pacientemente que parasse de chover.
Ao pé de si estava um jovem. Alto, bem-parecido, mas com um olhar cheio de aflição, visivelmente impaciente por aquela chuva inesperada.
Margarida resolveu sorrir-lhe, disposta a meter conversa para passar um pouco melhor o tempo.
- Parece que estamos aqui presos...
O rapaz, meio desconfiado, meio a medo, lá acabou por responder.
- É, com esta chuva toda e sem chapéu... Uma maçada não é?
Margarida inspirou e sentiu o aroma das flores que estavam à venda na florista da esquina antes de responder. Ao sentir o aroma familiar da terra molhada misturado com rosas sorriu.
- Não, não é.
O rapaz olhou-a espantado, perguntando-se se teria dito alguma asneira, ou se esta seria mais uma lunática como tantas outras que para aí andavam.
Ao vê-lo a olhar para ela de maneira inquiridora, Margarida sorriu ainda mais.
- A beleza do dia está nos olhos de cada um. Você vê um dia mau. Eu vejo simplesmente mais um dia e não faço planos para ele, não crio expectativas. Simplesmente sei o que tenho para fazer. Como e quando o faço é-me indiferente. Assim não me aflijo com horários ou imprevistos.
O rapaz pareceu ficar ainda mais intrigado.
- Mas como pode ser lá isso? Você não tem que ir trabalhar? Não tem um horário a cumprir?
- Tenho, como toda a gente. Mas se o Universo me deu um furo no pneu, como hoje e me pôs debaixo desta varanda no exacto momento em que desatou a chover, em vez de o encarar como uma chatice, encaro-o como uma oportunidade.
- Uma oportunidade? De quê?
- Bem, não me molhei no caminho, não furei o pneu em situação perigosa no meio do trânsito, estou a cem metros de casa e ainda vou a tempo de ir apanhar o autocarro. Quanto aposta? - respondeu-lhe ainda a sorrir.
Nesse exacto momento, um raio de sol brilhou entre as nuvens e apareceu um maravilhoso arco-íris no céu.
O rapaz olhou-a e, pela primeira vez o seu olhar deixou de estar carregado de urgência e exibiu um sorriso.
- E se entretanto conseguir fazer alguém sorrir neste período de espera, então o dia será ainda mais maravilhoso! - continuou Margarida que se agarrou na bicicleta e se começou a dirigir de novo para casa.
O rapaz ainda sorria quando ela virou costas. Só passados alguns momentos conseguiu articular as palavras que lhe assolaram o coração.
- Obrigado! Tenha um bom dia!
Margarida parou por um pequeno instante para se voltar para trás e sorrir de volta.
- Para si também. - respondeu.
Quando voltou a sair de casa para ir para a paragem de autocarro, tinha um rosa branca no degrau da sua porta.
Agarrou nela e cheirou-a, sentindo agora o aroma mais intensamente no seu coração. Ao invés de a deixar em casa, levou-a consigo, carregando as suas boas vibrações junto ao coração.
Nunca se sabia o que estava por acontecer. E aquele doce aroma poderia ser a poesia em falta na vida de outro alguém...


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